sábado, 17 de setembro de 2011

Da intervenção patética de AJJ à hipocrisia, num país de políticos de "vão de escada"

Confesso que não tinha muita vontade de escrever sobre o “colossal buraco financeiro” da Madeira, uma vez que quase tudo já foi dito, desde a violenta crítica ao seu contrário, passando pelo silêncio aterrador de algumas das personagens mais tenebrosas do actual governo, até à hipocrisia desajeitada do Primeiro-Ministro.
Porém, a intervenção de AJJ, de ontem, num comício da campanha eleitoral para a Região, impôs que abordasse este tema.
A intervenção foi verdadeiramente patética, de um político que sabe que chegou ao fim, mas que não quer largar o poder.
Há alguns anos um amigo dizia-me que nunca como Madeira se confundia o partido do poder com o governo e este com o partido do poder, tal a promiscuidade que existia, aos mais diversos níveis, na vida pública.
Desde Cavaco Silva a Passos Coelho, passando por Guterres, Barroso – Santana Lopes não teve tempo para trapalhadas na Madeira – e José Sócrates, todos sabiam que a Madeira era um poço sem fundo, um desgoverno, um caso claro e evidente de delapidação dos dinheiros públicos ou mesmo um caso de polícia.
Mas todos silenciaram a situação, uns por receio de perder as eleições – o PSD, outros - do PS – porque não queriam um confronto com AJJ, nem sujeitar-se aos seus insultos grotescos, que eram igualmente distribuídos por todos os que o criticavam.
Agora, com a “troika” chegou-se ao fim da linha e as evidências não puderam continuar a ser escamoteadas.
A Madeira não é um “study case” da ciência política, mas um caso de desvario financeiro à custa dos contribuintes portugueses do continente – desse malfadado continente que AJJ insultava a torto e a direito – que foi pagando tudo e mais alguma coisa – seria interessante comparar o poder económico de algumas pessoas na Madeira, antes do 25 de Abril e neste momento e saber como conseguiram esse poder económico -, e que ajudou AJJ a manter a teia de interesses que o levam a vitórias eleitorais sucessivas.
Daqui chegamos à hipocrisia “manhosa” de Passos Coelho, quando remete para os eleitores madeirenses a punição ou a perda de confiança política em AJJ.
Em primeiro lugar, Passos Coelho sabe que AJJ vai ganhar as eleições regionais, por duas ordens de razão: na Madeira existe um clima de asfixia democrática e de “terrorismo de estado”, que impede qualquer acção que contradite o poder instalado e porque, graças ao “colossal buraco financeiro”, os madeirenses possuem benesses que os contribuintes do continente, que lhes pagam e que suportam os sacrifícios impostos pelo governo e pela “troika”, não possuem.
Ou seja, só por hipocrisia, refinada hipocrisia, mas que deve ser desmascarada, é que se pode remeter para os madeirenses a critica política a AJJ.
Ainda falando de hipocrisia, talvez fosse bom que, para bem da política e da credibilidade da política, se deixasse de atirar, em permanência, à cara uns dos outros, os erros cometidos no exercício de funções governativas. Num regime democrático, as sanções são impostas pelos eleitores, que despedem os faltosos. Não se pode esperar que passem o tempo a açoitar-se ou a reconhecer os erros do passado. Se assim fosse, a Igreja ainda estaria a pedir desculpa pela Inquisição, o PCP pelos desmandos do “gonçalvismo”, o PS pelos erros dos primeiros governos constitucionais, o PSD e Cavaco Silva pela criação do “monstro”, Guterres pelo “facilitismo”, Barroso pela colaboração com a invasão do Iraque e pelo “pais da tanga”, Santana Lopes pelas trapalhadas, e assim sucessivamente.
O futuro é que conta e o futuro não é estar agarrado ao passado. Só os burros é que não mudam e pretender condicionar a acção política com os erros do passado é um erro dos nossos políticos de "vão de escada".
Infelizmente, receio que isso não venha acontecer, porque o nosso sistema parlamentar é arcaico – a Assembleia da República é um repositório do que de pior teve a 1ª República – e muitos dos nossos políticos não passam de políticos de "aviário" ou de "vão de escada".
Mudar a estrutura do Estado implica mudar a forma de fazer política, os políticos e a organização do Estado, desde o sistema eleitoral, à concepção dessa estrutura. Mudar, apenas, meia dúzia de institutos e reduzir chefias, é a chave  para assegurar que, no essencial, nada muda.
NOTA: Acabei de ouvir os responsáveis pelo PS/Madeira a defender que a dívida colossal da Madeira deveria ser anulada. Se AJJ é um político em fim de ciclo, os dirigentes do PS/Madeira já acabaram, antes de terem começado.